domingo, 26 de abril de 2015

(Dez) encontros

Leia e ouça: Um dia a gente se encontra

  Foi numa quinta. Chovia, era tarde. A sala de cinema mais gelada do universo. Você, eu, uns gatos pingados a mais. Um drama da vida real rolando na tela, um beijo roubado do galã na mocinha, e aquele final que todo mundo prevê. Os créditos sobem, seguimos por caminhos nem tão opostos em direção a vidas completamente desconhecidas. Primeiro encontro.
  Três meses depois, reparo nos cabelos molhados que escorrem pequenas gotas numa blusa quatro números maiores. Era você na fila do banco, na minha frente. Apressada, impaciente. Além dos fios molhados, limpa as mãos suadas no shortinho jeans revelador de uma marquinha de nascença que eu não vi a primeira vez. Senha chamando, contas pagas. Segundo encontro.
   Volta de feriado prolongado. Trânsito parado na via mais importante da cidade. Minha banda preferida toca no rádio, enquanto me desespero por ter que ficar ali feito uma estátua - Alguém já parou pra contabilizar quanto tempo a gente perde no trânsito? Acho que não. - um ônibus azul encosta ao meu lado, a garota debruçada na janela observa as luzes que se acendem aos poucos na grande metrópole. Você, que é só mistério. Pensava em quê? Vejo fones de ouvido pendurados também, uma pena você não ter ouvido a mesma música. Terceiro encontro.
   O quarto foi do tipo que se Deus existe, até ele duvidaria. Quem poderia imaginar que um carro quebrado me faria te ver? Com tantas oficinas na cidade, a do seu Manuel foi a sua salvação justamente no dia que eu passava pra deixar o cheque. Quem será essa mulher? O que faz? O que gosta? Impossível não se perguntar, devanear, te pôr um nome. Engraçado isso como a gente precisa criar um jeito de identificar todo mundo, né?Engraçado também foi que mesmo com tamanha oportunidade, não consegui perguntar seu nome. Deixei ali o cheque, entrei no carro e te vi sorrindo sozinha. Fui reconhecido?
  Meses depois, quando eu pensei ter esquecido seu rosto - acho até que foi um ano e pouco - é você quem me liga, por engano mas vale, procurando um Fernando, que provavelmente anotou o número errado no seu celular. Ah se eu soubesse, teria sido um pouquinho mais educado e pausado o jogo de vídeo-game. Quinto encontro, ou desencontro, como quiser chamar.
  Parecia até de propósito te enxergar no trânsito, na fila do banco, no supermercado passeando pelos corredores de ração no sexto encontro. Pelo jeito você tem um cão, eu tenho um gato, sabia? E parece até que é disso que estamos brincando, um morde e assopra sem fim, avança e recua, mais recua do que avança.
  Quantas vezes não teria eu te visto em tantos outros lugares, e sabe se lá porquê ainda não tinha reparado. Teria sido a magia de uma sala de cinema gelada? São tantas perguntas sem resposta. Aliás, todas elas são respondidas pela minha imaginação. Mas é inevitável me perguntar quantas outras vezes te vi sem te notar, e mais, será que você já me notou?
  Um total de nove encontros, numa padaria, na livraria folheando revistas de saúde e outro numa caminhada no parque. Você correndo com seu cachorro e novamente os fones de ouvido que roubavam minha coragem. No décimo, a chance mais palpável a sala de espera do dentista. O silêncio constragedor que exige conversas sobre amenidades com a secretária. Você pergunta dos filhos, ela pergunta do Pepeu - seu cachorro?- chamam do consultório: Renata. Renata entra. É como um clique, entende? Minutos a mais e logo você sai. Melhor dizendo, Renata sai, porque eu ainda nem te conheço. Minha vez, detesto dentistas. Mais um desencontro, mas a vida se encarrega de me fazer te encontrar se for preciso.

quinta-feira, 9 de abril de 2015

Você mudou a minha vida

Leia e ouça: Perfectly

   Você mudou a minha vida. Não, não estou sendo exagerada, não estou fazendo isso pra chamar sua atenção. Só estou dizendo isso porque essa é a verdade que eu nunca te disse.
  Você mudou a minha vida. Você jogou tudo pro alto quando me deixou entrar por aquela porta, aquela que levava á um paraíso ainda desconhecido pra mim. Você transformou tudo ao me pedir que ficasse mais um pouquinho naquela tarde fria de setembro. Você fez do caos alegria, e das incertezas um prazer. Você me deu infinitos em minutos contados, minutos que eu também contava pra ficar ao seu lado. Você fez do nunca, um agora.
  Você mudou a minha vida. E isso não é devaneio de mulher apaixonada, não. Você me mostrou que felicidade bate na porta quantas vezes for preciso, todas as vezes que tocou a campainha do meu apartamento de madrugada. Você me ensinou que amor é, antes de qualquer outro clichê, parceria. Me deu a certeza de que sexo foi feito pra dois, e que delícia éramos nós dois.
  Você mudou a minha vida. Você me ofereceu mais do que todo o resto já tinha oferecido um dia, mais do que uma cama, uma química ou um café. Me ofereceu a mão, o ombro, o colo e os ouvidos pra escutar todos os meus problemas, sem fórmulas pra tentar resolvê-los.
  Você mudou a minha vida das maneiras mais imprevisíveis, e simples apesar disso. E eu me pergunto porque nunca ninguém o fez antes. Porque nunca ninguém me fez acordar no  meio da noite porque tive um pesadelo e ligar desesperada, ainda com a voz embargada pra saber se estava tudo bem; Porque nunca ninguém me fez entender e gostar de coisas que eu a vida inteira questionei. Porque nunca ninguém foi mais que uma simples superfície, porque nunca ninguém me fez desejar profundo desse jeito. Porque tinha que ser você.
 Tinha que ser você a chave que me abriria portas, tinha que ser você quem me faria sorrir e chorar ao mesmo tempo.Tinha que ser você o cara que eu chamaria de "idiota", e também de "meu amor". Tinha que ser você o responsável por mudar a minha vida, virá-la de ponta-cabeça, me trazer de volta e ainda me fazer gostar. Tinha que ser você, o tempo todo.

segunda-feira, 6 de abril de 2015

Dias ruins também chegam ao fim

Leia e ouça: Fácil

  Passei algumas horas tentando escrever esse texto. Pra falar a verdade, eu já estava mais do que decidida a deixar pra lá e guardá-lo na pastinha de rascunhos, e talvez tomar um banho e misturar as lágrimas com a água do chuveiro, como tantas vezes o fiz. Eu estava decidida a deixar pra lá, e só deitar a cabeça no travesseiro, porque assim quando eu finalmente pegasse no sono, o dia acabaria e amanhã eu teria uma nova chance.
  Contrariando tudo isso, eis que passeando pelas redes sociais encontro um vídeo desta música que coloquei neste texto. O responsável pos postá-la nem imagina, mas me fez rir um riso sincero, um misto de alívio e compreensão.
 Talvez não seja a sua banda favorita, talvez não seja nem o gênero musical que você está acostumado, mas especialmente hoje esta música me fez erguer a cabeça e parar de chorar em frente ao espelho enquanto escrevia esse texto. Uma simples frase, me fez perceber que eu não sou a única, entende? Que na verdade, ninguém é feliz todos os dias. Me fez perceber que dias felizes são raros pra muita gente, e porque não dizer pra mim? A gente tem mania de querer demonstrar felicidade o tempo todo, mas parafraseando outra canção especial, a gente esquece que ser feliz o tempo inteiro é sinal de desespero.
 Somos humanos, eu e você sentimos. Mas porque é que a gente ás vezes insiste em esconder o que sente? Se permitir sentir é abrir caminho pra felicidade, e pra tristeza também. E é por isso que eu assumo, eu choro, grito, borro a maquiagem, e me aquieto num canto porque não estou bem. Porque tem dias que a gente simplesmente se sente só, a gente é capaz de enxergar uma multidão a nossa volta, mas sente um vazio dentro de si. E porque diabos isso não pode ser normal?
  Em dias como esses, você vai ouvir gente falando que é TPM, gente dando palpite aos montes na sua vida pessoal, profissional, e até no modo como você lida com seu peixinho dourado. As pessoas vão querer buscar explicações, vão te aconselhar, vão dizer que já passaram por isso ou por coisa pior. E  embora tudo isso só te deixe mais irritada,  entenda  que é a verdade, todo mundo já passou por um dia ruim. Mas dias ruins também chegam ao fim.

quinta-feira, 2 de abril de 2015

Pressa do mundo

Leia e ouça: Vagalumes Cegos

  Desde muito pequena gosto de observar as pessoas. Tenho um hábito meio maluco de criar histórias, inventar vidas para as pessoas que passam por mim no dia a dia, imagino o mundo que elas vivem, as pessoas que elas amam, e tudo aquilo que elas tem pra contar. São estranhos que eu adoto pro meu mundo, e me deixo conviver ainda que secretamente.
   Graças a esse costume, acabei conhecendo gente especial que ou ficou intrigado por eu tanto observá-lo no trem de volta pra casa, até gente que simplesmente decidiu compartilhar minutinhos da vida comigo por vontade própria. Dessa gente toda, inclusive daqueles que nem imaginam meu nome, das conversas de ônibus, das brigas de namorado, das despedidas de rodoviária, percebi algo neles e em mim mesma... Tem gente com pressa demais de viver.

   Pressa. Sempre foi um problema pra mim, nascida prematura tive pressa de vir ao mundo, pressa no colégio, pressa de me formar. Sargitariana que sou - não sou de acreditar muito em horóscopo, mas vai que, né? - sempre muito ansiosa. Não sei até que ponto a maturidade pode ter colaborado pra essa constatação, mas descobri que a pressa me atrasa. E com certeza te atrasa também.
  Não vou começar com hipocrisias e conselhos que todos nós já sabemos de cor, sobre deixar a vida acontecer no tempo dela. É claro que eu quero que as coisas dêem certo na minha vida, eu também faço planos assim como você, eu também sou humana e tenho sonhos, e torço pra que eles se realizem rapidamente. A questão aqui é que todo esse desespero, essa ânsia atrapalha, porque a gente foca tanto numa coisa e transforma aquilo no objetivo de nossas vidas, que se esquece que há outras coisas tão bonitas e tão (ou mais) gostosas pra se aproveitar nesse mundo.
  Quem tem pressa da vida vira presa do mundo. O segredo é deixar a onda bater, o sol queimar, o vento soprar, e o tempo passar. Sim, porque o tempo é a chave de encaixe perfeito, e a vida acontece quando tem que acontecer. É, menina, aquieta esse coração desesperado, e vive. Vive de verdade, vive com vontade, sem pressa de ser feliz porque é como dizem: O que vem fácil, vai fácil. E felicidade não é o tipo de coisa  que a gente vá deixar passar.